Síndrome do Ninho Vazio
Entrevista com Odair J. Comin para a Revista Necessaire
Tema: Síndrome do Ninho Vazio
Por Amauri Eugênio Jr.
1) De modo geral, como a Síndrome do Ninho Vazio pode ser conceituada e explicada?
Odair J. Comin: Normalmente nossa vida é pautada por hábitos, rotinas que estabelecemos em nosso dia a dia que com o tempo, se torna um padrão. O ato de ser mãe é um padrão aprendido e consolidado no exercício da maternidade. Cria-se a identidade da mãe, e quanto mais dedicada for, maior será seu envolvimento com essa identidade. Em alguns casos, esse papel se torna maior que todos os outros. Ocupa grandes espaços. Com a saída dos filhos de casa, esse papel recebe uma drástica diminuição em sua importância. Um belo dia ela olha no espelho e não se reconhece mais, se vê sem função. O que por vezes pode gerar a síndrome do ninho vazio.
2) Mesmo ao se levar em conta que se trata de um processo natural da vida, por que a saída dos filhos de casa traumatiza tanto as mães?
OJC: Ser mãe é algo eterno, ela não deixa de ser mãe, mesmo com a morte do filho. Essa verdade a impede de ver muito longe. Normalmente a mãe tem dificuldade em perceber o crescimento do filho, dificuldade de permitir sua autonomia, sua independência. É como se o filho nunca fosse sair de casa e sempre fosse precisar dela. Não é que ela não consiga ver, mas muito mais porque ela não quer ver. Da mesma forma que sabemos que vamos morrer, mesmo sabendo dessa verdade absoluta, mesmo assim, ainda temos dificuldade de lidar com a morte, ainda nos traumatizamos com ela.
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3) Nesse caso, como a solidão é repercutida psicologicamente? Há o risco de desencadeamento de depressão ou até mesmo complicações físicas? Por quê?
OJC: Qualquer tipo de mudança ou perda, quando não elaborada, quando não se consegue lidar com essa realidade, pode ser causadora de complicações psicológicas e mesmo somatizações. O simples fato de não aceitar pode gerar tristeza, pode trazer a perda do sentido de sua vida. Como sua identidade de mãe ocupava quase todos os espaços, sem esse papel a mãe se vê perdida, sem perspectivas. O sofrimento é o caminho natural, quando não se consegue elaborar uma perda.
Síndrome do Ninho Vazio
4) Em casos nos quais os filhos saem de casa e a mulher ainda passa por divórcio, como a mudança no estilo de vida é acentuada? E o que pode ser dito em casos de casais sem filhos?
OJC: São duas perdas importantes e que podem gerar grande sofrimento. A saída está em se reencontrar. Principalmente no papel de mulher, voltar a se perceber. Retomar sua individualidade, que normalmente se perde com a vinda dos filhos e mesmo no casamento. Dar ênfase à parte profissional também pode ser uma saída saudável, contudo, não se deve apostar todas as fichas. É um momento de aprendizagem para que possa perceber que um papel nunca deve anular o outro, e que todos precisam conviver simultaneamente. Seja o papel de mãe, de mulher, de esposa, de amiga ou profissional. O que serve também para a mulher que se separa sem filhos, é preciso se reinventar, refazer sua vida. Estabelecer novas conexões e relações.
Consequências do Ninho Vazio
5) Em casos extremos, o que esse panorama (filhos morando fora e divórcio) pode causar à mãe? Por quais motivos?
OJC: Na medida em que não se elaboram essas mudanças as possibilidades podem ser:
– Depressão: é bastante comum, exatamente pelo fato da perda de perspectiva. Quando se cultiva a solidão e não busca alternativas. O pensamento negativo se estabelece, tanto do presente quanto do futuro.
– Insônia: também é comum, causada principalmente pela tensão que se cria nesse momento.
– Ansiedade: ocorre pelo fato de não saber o que será a partir de agora, como será seu futuro. E por todos os pensamentos que se entrecruzam em sua mente.
– Somatizações: por vezes a mulher pode apresentar impactos físicos como gastrite nervosa, enxaqueca, úlcera, fibromialgia ou mesmo nódulos.
– Compulsões: pode se apresentar quadros de compulsão, seja por comida ou compras dentre outras.
– Perda de identidade: na medida em que a mulher não cultivou seus outros papéis, a tendência é ficar no vazio.
– Perda do sentido da vida: nestes casos a dor e o sofrimento e mesmo pensamentos de morte começam a fazer parte do seu dia a dia.
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Medidas a serem tomadas
6) Quais são as primeiras medidas que a mulher deve adotar para lidar com a ausência dos filhos?
OJC: Buscar novas conexões. Buscar abrir espaços para novos papéis, ocupar seu tempo. Seja consigo mesma, com amigos, familiares, mesmo o próprio ambiente de trabalho. E se perceber que não está sendo suficiente, que não está conseguindo elaborar essa mudança buscar ajuda profissional.
7) É possível atenuar a ausência por meio de contatos via ligações e redes sociais? E quão benéfico é recebê-los como visitas em casa, ou visitá-los? Por quê?
OJC: Os filhos saírem de casa não significa que deixarão de ser filhos. Portanto, todo contato é importante. Ter diferentes canais de comunicação é relevante para os dois lados. Isso porque, é comum uma mãe superprotetora gerar filhos dependentes. Com isso, para eles também poderá ser difícil estar longe. O contato pode ser cicatrizante para ambos.
Autoestima Feminina
8) Como o fato de voltar a morar sozinha pode ser bom para a mulher voltar a priorizar suas próprias vontades e a fomentar a autoestima?
OJC: Voltar a morar sozinha pode ser uma escolha ou uma imposição, dependerá de como foi a separação. Contudo, independente disso, sem dúvida é preciso lidar com o real. A realidade agora é que está sozinha e isso pode ser sim uma oportunidade de se reconectar consigo mesma. Voltar a fazer coisas que talvez deixou de fazer. Voltar a fazer ou descobrir novos programas. Dar valor às suas vontades e desejos e poder satisfazê-los. A vaidade por vezes pode ser esquecida no casamento, recobrar esse cuidado consigo mesma pode ser benéfico. Além de se preencher internamente com conteúdos que a fortaleçam. Não apenas fisicamente mas emocionalmente ela precisa se preencher.
9) Quando ela deve recorrer à ajuda psicológica? Por quais motivos?
OJC: Se ela perceber que não está conseguindo lidar sozinha com as perdas, a psicoterapia deve ser considerada. O ideal é que seja antes de sintomas aparecerem, mas nem sempre é possível. Todavia, quando se perceber depressiva, ansiosa ou com somatizações deve buscar ajuda. A separação em si normalmente não é fácil para ninguém. Por certo pode gerar diferentes impactos destrutivos. A terapia serve para minimizar os danos, fazendo com que essa transição possa ser mais tranquila, equilibrada e saudável.
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Novos Relacionamentos
10) Procurar por novos relacionamentos é útil ou pode ser um traço de dependência afetiva? Por quê? E qual é a linha tênue nesse caso?
OJC: Mesmo que o senso comum diga que apenas um novo amor cura o antigo, nem sempre isso é saudável ou verdade. Por vezes ,é importante passar um tempo sozinha para elaborar o luto, elaborar essa perda. O tempo serve para romper com as conexões da relação passada, para então quando a nova relação acontecer, possa estar e envolver-se por inteiro. Entretanto não há uma regra definitiva, e nem significa que uma forma é melhor do que a outra. Depende muito de como cada mulher lida com a separação. Por vezes ela pode envolver-se rapidamente com outra pessoa e esta servir de apoio para curar as feridas, e poder rapidamente se entregar ao novo amor. Cada mulher deve perceber seus limites e o que é razoável para cada uma.
11) Grupos de apoios de pessoas que sofrem com a síndrome do ninho vazio são úteis até em que ponto? Por quê?
OJC: Pode ser útil, desde que ela se sinta confortável no processo. Ela precisa se sentir a vontade com essa exposição, com o fato de compartilhar com outras mulheres a sua história. Caso contrário, seria mais saudável uma ajuda individual, como na psicoterapia, onde sua privacidade será preservada. Portanto, é uma decisão individual de cada mulher.
Odair J. Comin
Psicólogo Clínico, Hipnoterapeuta e Escritor.
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